Nada tenho de pessoal contra Lupércio Perdão, minto. Tenho sim: a orelha de porco. Me explico. Na década de 60, no chiqueiro da casa dos padres redentoristas, em Coari, chafurdava uma porca rosada e roliça, que atendia pelo inexplicável nome de "Madre Superiora" Num ensolarado domingo de páscoa, ela foi sacrificada pela cozinheira do seminário, dona Maritó, que merece um parágrafo – o próximo - só para ela.
Dona Maritó exibia na perna uma feridona braba, incurável e misteriosa, capaz de desafiar todas as juntas médicas do Hospital Tropical Por isso, o então seminarista e depois deputado Domingos Sávio Ramos de Lima, hoje pisando em brasas, tinha nojo da comida que ela fazia. Sobretudo se fosse peixe. É que um dia ele viu dona Maritó, de cócoras, tratando jaraqui sobre uma tábua, numa íntima promiscuidade entre a peixe e a ferida. Para tirar as escamas grudadas na faca, ela passava a lâmina sobre a perna doente, de um lado e de outra como se a estivesse amolando. Depois, voltava a escamar e a ticar o peixe com a mesma faca maculada com o líquido purulento da ferida.
O meu dileto amigo Domingos achava que era pecado. Não o ato anti-higiênico da dona Maritó, mas o seu próprio sentimento de asco: era falta de caridade. Como ele não exercitava ainda o controle da mente, ficou com um monumental sentimento de culpa, pensando que jamais seria um missionário como padre Damião, o Leproso. Durante cinco anos, Domingos confessava-se todos os sábados:
- Padre, pequei contra a caridade.
Rezou rosários e rosários de penitência, passou fome, mas nunca-jamais-em-tempo-algum comeu peixe de dona Maritó, Aliás, nunca mais comeu qualquer peixe em sua vida. Ficou tão traumatizado, que até hoje odeia peixe, visceralmente. E psicológico, gente!
Mas o que é que a leishmaniose da dona Maritó tem a ver com o Lupércio? Ah, leitor (a), sem a dona Maritó não seria possível recompor o quadro psicoafetivo daquele momento. Confesso, no entanto, que me dispersei uns pouco. Vamos corrigir a rota. Onde é mesmo que nós estávamos? Ah, já sei. A porca! Claro, a porca. A dona Maritó preparou-a no forno, num domingo de páscoa e é isso o que interessa,
Madre Superiora
Quando viva, além de uma fileira de peitos, a "Madre Superiora" ostentava umas longas orelhas caídas pra frente, que chegavam a encobrir os seus olhos. Justamente, foi uma delas que sobrou pra mim. De pura sacanagem, na hora do almoço, colocaram a orelhona no meu prato. Acontece que dona Maritó não havia pelado a porca direito e sua cavidade auricular estava entupida de cabelo duro, espeta-caju, como se fosse um ninho de porco-espinho.
Parece que a “Madre", como também era abreviadamente chamada, sofria de otite externa, por que sua orelha estava inflamadona. Do prato onde repousava, ela, a orelha peluda e inchada, me olhava ameaçadoramente, como uma aranha caranguejeira. Berk! Era um negócio repugnante, obsceno, que me tirou o apetite. Daquele dia em diante, passei a ter um asco compulsivo de orelha de porco e, por extensão, de pessoas com orelhas cabeludas. Eis aonde eu queria chegar: o Lupércio é uma delas. É ou era. Não sei se hoje ele já faz depilação.
Na verdade, este é o meu único lance pessoal contra o Lupércio: ele tinha - ainda tem? – a orelha cabeluda. Ele achava - ainda acha? - lindo de morrer exibir os pelos auriculares. Na época em que foi meu aluno, possuía - ainda possui? - uma caudalosa "moita de capim", que nascia dentro do seu conduto auditivo externo, expandia-se pela concha e pelo pavilhão auricular e descia em cascatas pelo lóbulo, Era escandaloso. Dava para fazer propaganda de xampu.
Durante as aulas, Lupércio, que acabara de migrar do interior, tinha a mania de ficar passando o pente marca “flamengo” na sua cabeleira e, antes de guardá-lo no bolso, dava uma ligeira penteada nos pentelhos de sus orelha, talvez para desobstruir a passagem de som para os tímpanos. Completava a operação, enfiando a ponta da tampa da caneta “Bic”no ouvido, para de lá retirar cera. Ele ia buscar fundo, lá na Trompa de Eustaquio.
A touceira de pelos na orelha dá uma ideia de sujeira suína, de falta de asseio, de imundície, de algo maritozalmente anti-higiênico. Que Deus me perdoe a falta de caridade, mas tenho nojo, porque sempre associo orelha cabeluda com porcaria e ferida de Maritó. Cheguei mesmo a interromper um namoro promissor, quando observei uma discreta penugem, formando-se na orelha da Marluce Saubinha (Ih, não era para escrever o nome dela. Agora é tarde). Só Freud explica. Freud e Manoel Dias Galvão.
Meninos de rua
Racionalmente, sei que isto é uma bobagem. Existem algumas pessoas limpas, honradas, de bom caráter, com orelhas cabeludas. Na verdade, pouco importa que o Lupércio tenha - ainda tem? - orelhas cabeludas (e o nariz também). Não foi por esta razão que o critiquei na crônica anterior (Quem é o Herodes de igarapé?). O que interessa é sua ação política contra os meninos de rua, neste projeto eleitoreiro cinicamente denominado "Nosso Filho".
E é aí que a Madre Superiora torce o rabo. O indivíduo Lupércio Ramos tem todo o direito de deixar crescer os cabelos nas cavidades que quiser e ninguém tem nada a ver com isso. No entanto, o secretário de Trabalho e Ação Social (SETRAS) não tem o direito de usar impunemente o dinheiro do contribuinte para sair dando porrada em crianças abandonadas nas ruas, com o objetivo de fazer colheita de votos no roçado de setores aterrorizados da classe média. A parte sadia da sociedade amazonense certamente mostrará sus indignação contra a ação nazistóide desse Herodes de igarapé (Aliás, Lupércio ficou chateado, porque ao sair de carro de sua casa alguém gritou: "He-ro-dis". E se escondeu detrás de um poste).
Pessoalmente, sinto-me no dever de protestar. Trata-se de uma crítica institucional e não pessoal. Não tem nome o que estão fazendo com os meninos de rua de Manaus. De 73 crianças recolhidas recentemente à prisão chamada "Escola Fazenda", mais de 20 fugiram, no domingo, dia 5, andando a pé os 28 quilómetros que separam a prisão do centro da cidade. Contaram que foram espancados com palmatória. Mas Lupércio, prepotente, não aceita críticas. Por isso, ele trocou o debate institucional sobre o projeto "Nosso Filho" pelo ataque pessoal aos que criticam a ação da SETRAS. Andou me difamando no programa "Encontro com o Povo" da TV Amazonas e ao promotor Públio Caio numa tentativa de desqualificar nossas críticas. Pura perda de tempo.
Faço um desafio público ao Lupércio. Cedo o espaço desta coluna para ele escrever o que quiser, se abrir espaço no seu programa de TV para a irmã Gustina e o Públio Caio. Ou então para o professor da UA, José Cyrino, que justamente está pesquisando sobre "A educação nos programas de atendimento à criança e ao adolescente na cidade de Manaus” para sua dissertação de mestrado. Será o projeto "Meus Primos”.
Furando a fila
O "Terceiro Ciclo” – projeto de governo do Amazonino - não sabe conviver com a crítica. Dois deputados puxa-sacos e terceiro-ciclistas, em uma sessão da Assembleia Legislativa, baixaram o nível para me atacar. Um tal de Nonato Lopes e um tal-e-qual Washington Régis (Quem é “isso"?) Nem vou me dar ao trabalho de responder. Em primeiro lugar, porque não vou permitir que eles furem a fila: existem outras "personalidades”, que me esculhambaram e estão esperando a vez para brigarem comigo. Em segundo lugar, porque numa Assembleia onde está presente a figura combativa, mesmo solitária, do deputado Eron Bezerra (PCdoB), qualquer calúnia recebe o troco na hora. Foi o que aconteceu. Obrigado, comandante Eron!
P.S. Recebi e agradeço a seguinte cartinha solidária assinada por um leitor:
"Parabéns professor! Como não perco uma vez o Taquiprati, hoje estou de sorriso largo.
“O sr. foi muito feliz em escrever sobre esse infeliz, o tal Lupércio Ramos (...). Ao mudar o canal de TV, vi o carcará sanguinolento tentando se justificar perante a opinião pública. Falou, falou, mas não disse nada, como bom aluno do Amazonino, seu chefe, mandou que seus funcionários ligassem para o programa de TV e se solidarizassem com ele, fazendo de conta que são telespectadores da desgraça alheia. Com direito a abono extra no final do mês.
Eu ainda cheguei a ligar pra lá, para que ele colocasse a minha voz no ar, o que não foi possível, só passavam as ligações dos que tinham a senha. Fiquei frustrado, pois aquela seria a hora de botar uma pimenta murupi bem dentro do olho dele.
Professor, continue dando o tratamento que esse Herodes merece! Um abraço do seu admirador. Afonso Luciano. (Seguem os números do RG e CPF)
P.S. Fotos para ilustrar a matéria pescadas na internet sem o nome dos autores.
Ver também QUEM É O HERODES DE IGARAPÉ? - https://www.taquiprati.com.br/cronica/484-quem-e-o-herodes-de-igarape-
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