Niños del mundo, si cae Argentina - digo, es un decir -
salid, niños del mundo; id a buscarla! (*)
Quem vai cair neste domingo épico no Maracanã? Os brasileiros estão divididos, mas não é entre Alemanha e Argentina. Não! Aconselho os alemães a desconfiarem das vaias e dos aplausos. Não há brasileiro contra nem a favor da Alemanha, sequer um mísero torcedor. É que Hans e Fritz, embora batam um bolão, não despertam paixões em nós. Nossa paixão é azul e branca. Uma parte do Brasil torce CONTRA a Argentina. A outra, a FAVOR da Argentina. Só ela estará em campo. A Alemanha é apenas um detalhe. Podia ser o Kudumundistão, que não seria diferente.
É uma rixa velha. Os brasileiros amam odiar os argentinos, já os argentinos odeiam amar os brasileiros. Para a torcida brasileira, o jogo não é entre as seleções dos dois países, mas entre Amor x Ódio à Argentina. Há muitas razões para amar os hermanos. Escolho cinco nos campos da música, literatura, cinema, história e futebol. E uma forte razão para odiá-los: o ethos nacional.
Começo por onde? Ah, a música! Fica deslumbrado com a Argentina quem ouviu Mercedes Sosa, frágil como um segundo, cantar o clássico chileno de Violeta Parra Gracias a la vida com Chico, Caetano, Milton e Gal. Ou quem escutou La Lunita Tucumana, tamborcito calchaqui, de Atahualpa Yupanqui:
- Yo no le canto a la luna / porque alumbra nada mas / le canto porque ella sabe / de mi largo caminar.
O amor pela música argentina é um patrimônio compartilhado por qualquer latino-americano que tem o privilégio de conhecê-la. Numa noitada em Santa Cruz de La Sierra, vi engenheiros bolivianos da Petrobrás chorarem com a lembrança de "un pueblito aqui, otro más allá" – de Catamarca - e despirocarem ao cantar guitarra nochera dos saltenhos Los Chalchaleros:
- Mojada de luz, es mi guitarra nochera, ciñendo voy tu cintura encendida por las estrellas.
Não é possivel omitir o genial Jorge Cafrune, que morreu tão cedo e tão rápido, aos 41 anos, num "acidente" misterioso em plena ditadura argentina. Ele cantou Tata Juancho, que "se fue despacio, despacio, p´a quedar un poco más" e - coitado - "en su vida sin domingos, nunca tuvo un guitarrear". E tornou célebre no mundo todo Zamba de mi esperanza, que é para ouvir de joelhos:
- Zamba, ya no me dejes, Yo, sin tu canto, no vivo más.
O velho amor
São tantos os ritmos: tango, milonga, chacarera, chamamé, gato, cueca, samba – sim, eles têm até samba, que lá é feminino, como deve ser: la zamba. O Brasil certamente torceria pela Argentina se, no lugar do hino nacional - "al gran pueblo argentino, salud!" - os jogadores entoassem no Maracanã a Zamba de la Candelaria, de Eduardo Falú, nascida na boquinha da noite, “cuando la luna lloraba astillas de plata la muerte del sol”. Ou Caminito. Ou ainda a Tonada del viejo amor: “no tengo miedo al invierno con tu recuerdo lleno de sol”.
Descobri, numa peña em Buenos Aires, que o bairro de Aparecida e toda Manaus cabiam dentro de Santiago del Estero ouvindo Como um pájaro en el aire de Cuti e Roberto Carabajal.Lá estava dona Elisa e suas proezas culinárias:
- As mãos de minha mãe / parecem pássaros no ar / Histórias de cozinha / entre suas asas feridas de fome.
Não foi sequer preciso recorrer a Gardel, o Martín Fierro do tango, para fazer um golaço na arena da música. No placar: Amor pelos argentinos 1 x 0 Ódio. O jogo podia terminar aqui, mas está apenas começando.
No meio de campo da literatura, os argentinos têm muitos craques que nos fazem amá-los. O maior deles, Jorge Luis Borges, romancista e poeta, produziu uma obra que contém todo o fervor de Buenos Aires e a história universal da infâmia: fantasias, delírios, jogos de espelhos, labirintos, sendeiros que se bifurcam. Cego e poeta, via no escuro, e assim sempre acertava o gol como em El Aleph com suas metáforas em histórias inventadas. Fazia com as palavras o que Messi faz com a bola: criava.
Nos anos 1960, o sonho de todo latino-americano era viver em Paris para escrever como o "cronópio" Júlio Cortázar, o outro craque argentino que lá morava e que criou tantos personagens inesquecíveis que jogavam amarelinha: Horácio, a distraída Maga e seu filho Rocamadour, Morelli, Perico Romero e tantos outros. Um dia, em 1972, ouvi Cortázar falar num Congresso de Literatura Latino-americana nos arredores de Paris, na Abadia de Royaumont, organizado por Jacques Leenhardt, nosso professor de sociologia da literatura. Foi nesse encantamento que redimensionei a minha, a nossa identidade. Somos todos irremediavelmente cronópios.
Ernesto Sábato, com seu desconcertante informe sobre os cegos; Bioy Casares, o inventor de Morel, e Ricardo Piglia com nome falso e respiração artificial seriam escalados em qualquer seleção literária do planeta, da mesma forma que Juan Gelman, esse filho de judeu ucraniano, cuja poesia tem ironia, humor, amor – Amor que serena, termina? – e está marcada pela dor e pela morte. Lutou contra a ditadura militar que assassinou seu filho e viveu como "um esperançoso sem remédio". No campo da literatura, o segundo gol: Amor 2 x 0 Ódio. Terminou o primeiro tempo.
Locas de Mayo
O segundo tempo começa com a história recente. Um pênalti contra o ódio. Penalidade máxima cobrada pelas mães da Praça de Maio. Os argentinos prenderam os torturadores, incluindo ex-presidentes e generais de quatro estrelas. Reconquistaram a sua história roubada. Golaço: 3 x 0 para o Amor aos hermanos. Às vezes, é preciso conciliar, nesse caso não chame argentinos, mas brasileiros - e essa parece ser uma virtude nossa. Mas se for pra sair pro pau, chamem um argentino - essa é a virtude deles. As benditas locas de Plaza de Mayo não me deixam mentir. É o que chamamos popularmente de raça. Quando no Monumental de Nuñez, em 1993, a Colômbia derrotou a Argentina por 5 x 0, os hermanos morreram lutando com garra até o último minuto.
O quarto gol é no campo do cinema. Se você quer torcer neste domingo contra o adversário da Alemanha, não veja nenhum filme argentino, porque você ficará enfeitiçado. Os hermanos, com pouca grana, estão fazendo filmes de tirar o fôlego. Não foi por ação marqueteira que O Segredo dos seus olhos ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 2010. A História oficial, Nove Rainhas, Buenos Aires na era do amor virtual são obras primas, sem falar na delicadeza de Kamchatka, que narra as lembranças de uma criança, cuja família é perseguida pela ditadura. Como sabem contar uma boa história!
Os que torcem contra a Argentina podem alegar que os filmes são geniais, mas que eles tem um único e solitário ator: Ricardo Darín. E eu vos digo que é verdade, mas que eles não precisam de mais nenhum ator, porque Darín vale por mil.
Finalmente, vem o quinto e último gol que acontece no campo do futebol. Aqui pra nós, falo bem baixinho, que não nos ouçam para não inflar ainda mais o ego hiper-inflado deles, mas quem gosta de ver belas jogadas, ama os argentinos. Maradona e Messi são dois gênios que deram muita alegria, como Garrincha e Pelé. Amor 5 x 0 Ódio á Argentina.
Aos 45 minutos do segundo tempo, nasce o gol de honra da Alemanha na grande área do ethos nacional. Os hermanos são pretensiosos, arrogantes, desabusados, cheios de empáfia, marrentos – dizem as más línguas. Já perguntei a amigos latino-americanos, autores de tais acusações, se os argentinos que conhecem se enquadram nesse perfil. A resposta é sempre: "no, ese es diferente, es mi argentino". Formulei, então, a tese de que argentinos em abstrato são arrogantes, mas os de carne e osso, os amigos, são afáveis e doces. Exatamente como meu gato León, que se mostra indiferente com quem não conhece, mas não é de porra nenhuma, se desmancha todo com quem gosta.
- Qué raro, che! A gente pensa exatamente o contrário: o brasileiro genérico é divertido, alegre, extrovertido, mas o concreto é uma porcaria - me disse um argentino de brincadeirinha, só pra sacanear.
De qualquer forma, o bandeirinha não considera impedimento o fato de os hermanos concretos cultivarem como ninguém o dom da amizade pessoal. O juiz valida o gol. O jogo terminou: Amor 5 x Ódio 1.
Os cronópios
Com tal resultado, neste domingo, estarei torcendo apaixonadamente pela Argentina em lunfardo. Afinal, como já cantou Belchior, sou "apenas um rapaz latino-americano". Podeis objetar que os imigrantes alemães deram uma cor nova ao Brasil, que a Alemanha tem créditos para ser amada, com um timaço de primeira nos campos citados: Wagner, Goethe, Thomas Mann, Brecht, Marx, Engels, Hegel, Rosa Luxemburgo, Murnau, Fritz Lang, Fassbinder, Dietrich - o Gerhard, mas também a Marlene de Anjo Azul com sua voz rouca e sensual e até os artilheiros Müller e Klose.
É verdade, embora qualquer generalização nesse campo possa ser questionada, podemos jurar que os alemães são "famas" - ordenados, disciplinados e realistas, planejam tudo. Já os argentinos são "cronópios" como nós - sonhadores, criativos e anárquicos: improvisam tudo. Por isso, os bairros populares da América Latina, com toda sua diversidade de cores, não se encaixam nesta Alemanha austera e sisuda, mas cabem inteirinhos dentro desta Argentina briosa.
Esta declaração de amor aos hermanos não impede que em 2018, na Rússia, a gente não queira comer o fígado deles. Por isso quero que ganhem no Maracanã: sei que se vitoriosos ficarão in-su-por-tá-veis, mas vai ser um prazer esmagá-los como tricampeões em Moscou. O que seria de nós, brasileiros, se os argentinos não existissem? Sem a rivalidade com eles, nós morreríamos.
Agora, se a Argentina perder no Maracanã - digo, é uma forma de dizer e bato três vezes na madeira toc toc toc - ah, se a Argentina perder, meninos do mundo, ide a salvá-la.
P.S. - Errata: há brasileiros torcendo pela Alemanha que, aliás, merece o nosso carinho e dos meus amigos luteranos do Rio Grande do Sul, bem como dos pomeranos.
P.S - 2 (escrito depois do jogo) . Niños del mundo, id a buscarla!
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(*) Apropriação indevida do poema España aparta de mi este cáliz (1937) do peruano César Vallejo sobre a guerra civil espanhola. A versão original: Niños del mundo, si cae España - digo, es un decir - salid, niños del mundo; id a buscarla!
¡NO LLORES POR MÍ, ARGENTINA!
Niños del mundo, si cae Argentina - digo, es un decir -
salid, niños del mundo;¡ id a buscarla!(*)
¿Quién va a caer este domingo épico en el Maracaná? Los brasileños están divididos, pero no entre Alemania y Argentina. No! Les aconsejo a los alemanes que no confíen en las silbatinas ni en los aplausos. No hay brasileño contra ni a favor de Alemania, ni siquiera un mísero hincha. Hans y Fritz, aunque sean campeones de bola, no despiertan pasiones entre nosotros. Nuestra pasión es azul y blanca. Una parte de Brasil hace barra CONTRA Argentina. La otra, a FAVOR de Argentina. Esta pasión será la única en campo. Alemania es apenas un detalle. Podía ser Kulodelmundistán que no sería diferente.
Es una disputa antigua. A los brasileños les gusta odiar a los argentinos y los argentinos odian amar a los brasileños. Para la hinchada brasileña, el juego no es entre las selecciones de los dos países, sino entre Amor x Odio a Argentina. Hay muchas razones para amar a los hermanos.Escojo cinco en los campos de la música, literatura, cinema, historia y fútbol. Y una razón para odiarlos: el ethos nacional.
¿Por dónde comienzo? Ah, la música! Se deslumbra con Argentina el que haya escuchado a Mercedes Sosa, frágil como un segundo, cantando el clásico chileno de Violeta Parra Gracias a la vida con Chico, Caetano, Milton e Gal. O quien escuchó La Lunita Tucumana de Atahualpa Yupanqui, ouvindo o tamborcito calchaqui:
- Yo no le canto a la luna / porque alumbra nada mas / le canto porque ella sabe / de mi largo caminar
El amor por la música argentina es un patrimonio compartido por cualquier latino-americano que tiene el privilegio de conocerla. Una noche de juerga en Santa Cruz de La Sierra, vi ingenieros bolivianos de la Petrobrás llorar con el paisaje de Catamarca "un pueblito aquí, otro más allá" – y se regocijaron cantando guitarra nochera de los salteños Los Chalchaleros:
- Mojada de luz, es mi guitarra nochera, ciñendo voy tu cintura encendida por las estrellas.
No es posible silenciar sobre el genial Jorge Cafrune, muerto tan joven y tan rápido, a los 41 años, en un accidente misterioso en plena dictadura argentina. Él cantó Tata Juancho, que "se fue despacio, despacio, p´a quedar un poco más" y - "en su vida sin domingos, nunca tuvo un guitarrear". Hizo célebre en todo el mundo Zamba de mi esperanza, que es para escuchar de rodillas:
- Zamba, ya no me dejes. Yo, sin tu canto, no vivo más".
Ele cantou Tata Juancho, que "se fue despacio, despacio, p´a quedar un poco más" e - coitado - "en su vida sin domingos, nunca tuvo un guitarrear". E tornou célebre no mundo todo Zamna de mi esperanza, que é para ouvir de joelhos: "Zamba, ya no me dejes, Yo, sin tu canto, no vivo más".
El viejo amor
Son tantos los ritmos: tango, milonga, chacarera, chamamé, gato, cueca, zamba – sí, ellos tienen zamba, con ‘z’, en femenino. Brasil con certeza haría barra por Argentina si, en lugar del himno nacional - "al gran pueblo argentino, salud!" – los jugadores entonasen en el Maracaná laZamba de la Candelaria, de Eduardo Falú, nacida al comienzo de la noche, “cuando la luna lloraba astillas de plata la muerte del sol”. O Caminito. O aún la Tonada del viejo amor:
- “No tengo miedo al invierno con tu recuerdo lleno de sol”.
Descubrí en una peña de Buenos Aires, que el barrio de Aparecida y toda Manaos cabían dentro de Santiago del Estero, cuando oí Como un pájaro en el aire de Cuti y Roberto Carabajal.Allí estaba doña Elisa y sus proezas culinarias:
- Las manos de mi madre / parecen pájaros en el aire / Historias de cocina / entre sus alas heridas de hambre.
Ni siquiera fue preciso recurrir a Gardel, el Martín Fierro del tango, para hacer un golazo en la arena de la música. En el marcador: Amor por los argentinos 1 x 0 Odio. El juego podía terminar aquí, pero está apenas comenzando.
En el medio de campo de la literatura, los argentinos tienen muchos crackes. El mayor de ellos, Jorge Luis Borges, novelista y poeta, produjo una obra que contiene todo el fervor de Buenos Aires y la historia universal de la infamia: fantasías, delirios, juegos de espejos, laberintos, senderos que se bifurcan. Ciego y poeta, veía en la oscuridad y siempre conseguía acertar el gol como en El Aleph con sus metáforas en historias inventadas. Hacía con las palabras lo que Messi con la bola: creaba.
En los años 1960, el sueño de todo latino-americano era vivir en París para escribir como el "cronopio" Julio Cortázar, otro crack argentino que vivía allí y que jugó rayuela con tantos personajes inolvidables: Horacio, la distraída Maga y su hijo Rocamadour, Morelli, Perico Romero y tantos otros. Un día, en 1972, oí a Cortázar en un Congreso de Literatura Latino-americana en los alrededores de París, en la Abadía de Royaumont, organizado por Jacques Leenhardt, nuestro profesor de sociología de la literatura. Fue en ese encantamiento que redimensioné mi/ nuestra identidad. Somos todos irremediablemente cronopios.
Ernesto Sábato, con su desconcertante informe sobre los ciegos; Bioy Casares, el inventor de Morel, y Ricardo Piglia con nombre falso y respiración artificial serían escalados en cualquier selección literaria del planeta, así como Juan Gelman, ese hijo de judío ucraniano, cuya poesía tiene ironía, humor, amor – Amor que serena, termina? – y está marcada por el dolor y por la muerte. Luchó contra la dictadura militar que asesinó a su hijo y vivió como "un esperanzoso sin remedio". En el campo de la literatura, el segundo gol: Amor 2 x 0 Odio. Terminó el primer tiempo.
Locas de Mayo
El segundo tiempo comienza con la historia reciente. Un penalti contra el odio. Penalidad máxima. Los argentinos prendieron a los torturadores, incluyendo ex-presidentes y generales de cuatro estrellas. Reconquistaron su historia robada. Golazo: 3 x 0 de Amor a los hermanos. A veces, se necesita conciliar, en ese caso que no se llame a argentinos, sino a brasileños - esa parece ser una virtud nuestra. Pero si se trata de confrontar, llamen un argentino - esa es su virtud. Las benditas locas de Plaza de Mayo no me dejan mentir. Es lo que llamamos popularmente de raza. Cuando en el Monumental de Núñez en 1993, Colombia derrotó a Argentina por 5 x 0, los hermanos murieron luchando con garra hasta el último minuto.
El cuarto gol está en el campo del cinema. Si alguien quiere hacer barra este domingo contra el adversario de Alemania, que no vea ninguna película argentina, porque si no quedará encantado. Los hermanos, con poca guita están haciendo filmes maravillosos. No fue por lobby que El Secreto de sus ojos ganó el Oscar de Mejor Film Extranjero en 2010. La Historia oficial, Nueve Reinas, Buenos Aires en la era de amor virtual son obras primas, sin hablar de la delicadeza de Kamchatka, que narra los recuerdos de un niño y su familia, perseguida por la dictadura argentina. Y como saben contar historias!
Los que hacen barra contra Argentina pueden alegar que las películas son geniales pero que tienen un único y solitario actor: Ricardo Darín. Y yo os digo que es verdad, pero que no precisan de otro actor, porque Darín vale por mil.
Finalmente, viene el quinto y último gol, ese si en el campo del fútbol. Aquí, que nadie nos oiga, hablo bien bajito, para no inflar todavía más el ego hiperinflado, pero quien aprecia ver lances admirables, ama a los argentinos. Maradona y Messi son dos genios que dieron mucha alegría, como Garrincha y Pelé. Amor 5 x 0 Odio a Argentina.
A los 45 minutos del segundo tiempo, nace el gol de honra en la gran área del ethos nacional. Los hermanos son pretenciosos, arrogantes, llenos de auto-confianza, orgullosos, – dicen las malas lenguas. Ya pregunté a amigos latino-americanos, autores de tales acusaciones, si los argentinos que conocen se encuadran en ese perfil. La respuesta es siempre: "no, ese es diferente, es MI argentino". Formulé entonces la tesis de que argentinos en abstracto son arrogantes, pero los de carne y hueso, los amigos, son afables y dulces. Exactamente como mi gato León, que se muestra indiferente con quien no conoce, pero en realidad no araña ni muerde.
- Qué raro, che! Uno piensa exactamente lo contrario: el brasileño genérico es divertido, alegre, extrovertido, ya el concreto no es nada de eso - me dijo un argentino de broma, solamente para tomarme el pelo.
De cualquier forma, el juez de línea no considera impedimento el hecho de que los hermanosconcretos cultiven como nadie el don de la amistad personal. El referee valida el gol. Terminó el juego: Amor 5 x Odio 1.
Los cronopios
Con ese resultado, este domingo estaré haciendo barra con pasión por Argentina. En lunfardo. Al final, como ya cantó Belchior, soy "apenas um rapaz latino-americano". Podéis contra argumentar que los inmigrantes alemanes dieron un color nuevo al Brasil, que Alemania tiene créditos para ser amada, con un equipo de primera en los campos citados: Wagner, Goethe, Thomas Mann, Brecht, Marx, Engels, Hegel, Rosa Luxemburgo, Murnau, Fritz Lang, Fassbinder, Dietrich - o Gerhard, así como Marlene de Ángel Azul, cantando con su voz sensual, hasta los artilleros Müller y Klose.
Es verdad, pero aunque generalizaciones son siempre peligrosas, podemos decir que los alemanes son los "famas" de Cortázar - ordenados, disciplinados y realistas, planifican todo. En cambio los argentinos son "cronopios" como nosotros - soñadores, creativos y anárquicos: siempre improvisando. Por eso, los barrios populares de América Latina con toda su diversidad de colores no se encajan en esa Alemania austera y ordenada, pero caben enteros dentro de esa Argentina briosa.
Esta declaración de amor a los hermanos no impide que en 2018, en Rusia, uno no quiera devorarles el hígado. Por eso quiero que ganen en el Maracaná: sé que si victoriosos van a quedarse in-so-por-ta-bles, pero va a ser un placer arrasarlos como tricampeones.Pensando bien, ¿qué seria de los brasileños si no existiese Argentina? Nuestro espejo al revés. Sin esa rivalidad, no seríamos lo que somos.
Ahora, si Argentina pierde - digo, es un decir – y doy tres toques en la madera toc toc toc - ah, si Argentina pierde, niños del mundo, id a buscarla.
P.S.1 - Errata: hay brasileños haciendo barra por Alemania que por cierto, merece nuestro cariño y el de mis amigos luteranos de Rio Grande do Sul y de los pomeranos.
P.S.2 (escrito después del partido).: Niños del mundo, id a buscarla.
________
(*) Apropiación indebida del poema España aparta de mi este cáliz (1937) del peruano César Vallejo sobre la guerra civil española. La versión original: Niños del mundo, si cae España - digo, es un decir - salid, niños del mundo; id a buscarla!